quinta-feira, 12 de junho de 2014

BARRABRAVAS DEPORTADOS


"Todos os 2,1 mil barrabravas da lista serão deportados", diz chefe da Interpol. Delegado Luiz Eduardo Navajas garante que a ordem é clara: em caso de entrada no Brasil, argentinos com histórico de violência serão identificados e expulsos


por Mauricio Tonetto, ZERO HORA, 11/06/2014 | 19h07


Nas últimas décadas, os barrabravas foram responsáveis por grande parte das agressões em partidas de futebol na ArgentinaFoto: Noticias Argentinas


Com experiência de quatro anos de atuação na Fronteira do Brasil com o Uruguai, em Santana do Livramento, o atual chefe da Interpol no Brasil, delegado Luiz Eduardo Navajas, disse a Zero Hora que o controle da entrada dos barrabravas no país será rigoroso. Segundo ele, nenhum dos 2,1 mil nomes enviados pela Argentina às forças de segurança brasileiras vai passar.

– A ordem é bem clara para todos (barrabravas que vierem ao Brasil): serão deportados ou repatriados. Nós temos o direito de não permitir o ingresso de uma pessoa no país se for inconveniente.


Na véspera da abertura da Copa do Mundo em São Paulo, o chefe da Interpol explicou também que não há maiores preocupações com relação aos hooligans, já que na Europa os passaportes deles são confiscados durante a Copa do Mundo, sob pena de terem a prisão decretada.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista concedida a Zero Hora:

– Existe algum abuso na lista de barrabravas impedidos de vir à Copa?

– Para o Brasil, o que importa é a lista que o governo da Argentina nos enviou oficialmente. Eles mantêm um cadastro de pessoas banidas de entrar em estádios locais e, segundo um acordo de cooperação do Mercosul sobre segurança em eventos, pedimos a inclusão no nosso sistema. Além disso, nenhum país do mundo é obrigado a aceitar estrangeiros. Se a presença não for conveniente, não permitiremos a entrada.

– Todos os 2,1 mil nomes da lista estão nessa situação?

– Sim. Eles ingressaram, inclusive, com uma medida judicial para que a lista não viesse ao Brasil e perderam. Para nós, é uma situação tranquila no aspecto legal. A ordem é bem clara para todos: serão deportados ou repatriados.

– Como é feito o controle migratório dos estrangeiros?

– Existe um sistema chamado Sinpi – Sistema Nacional de Procurados e Impedidos – em todos os postos de fronteira. Ele identifica o número do passaporte e o nome da pessoa e revela a situação legal. Nos aeroportos é bem simples, mas em fronteiras terrestres, em que não há pontes, sabemos que eles podem entrar. Não fecharemos a fronteira 100%. Porém, haverá barreiras da PF, Policia Militar, Polícia Rodoviária Federal e policiamento ostensivo nas ruas. Em caso de identificação, é deportação sumária.

– Além dos argentinos, quais outros torcedores preocupam?

– Com relação aos hooligans é diferente. Na Europa há cadastros nacionais e quem está na lista nem pode deixar o país. A chance de conseguir é bastante pequena. Alguns países têm o controle menos rígido, e o que podemos fazer é vigiar a conduta dos estrangeiros desses países e analisar cada caso.

terça-feira, 10 de junho de 2014

BARRABRAVAS ARGENTINAS

ZERO HORA 05/06/2014 | 08h02


Relembre o envolvimento de barrabravas em brigas nas Copas. Episódios violentos e até fatais já foram registrados no México, na Itália, na França, na Alemanha e na África do Sul

por Mauricio Tonetto



Mais de 500 barra bravas, sem contar os do Boca Juniors e River Plate, são esperados para a Copa do Mundo do BrasilFoto: Noticias Argentinas


Nas últimas décadas, os barrabravas, integrantes de torcidas organizadas argentinas, foram responsáveis por grande parte das agressões em partidas de futebol na Argentina. Desde os anos 1920, conforme a ONG Salvemos al Fútbol (SAF), já causaram mais de 270 mortes. As regalias vividas por seus líderes são dignas de personagens da máfia. A cúpula da Guardia Imperial, do Racing Clube, por exemplo, fez um cruzeiro pelo Brasil no ano passado ao custo de US$ 1,6 mil, por pessoa. De acordo com o jornal argentino La Nación, eles movimentam cerca de 200 mil pesos (R$ 56 mil) mensais em revenda de ingressos e merchandising de artigos oficiais.

Em comum, além de uma vida bancada por esquemas de corrupção e ameaças, um ambiente de impunidade, que favorece a perpetuação de lideranças negativas. De 10 nomes considerados mais perigosos pelo editor do diário esportivo argentino Olé, Gustavo Grabia, 46 anos, hoje o maior especialista em barra bravas no mundo, todos já tiveram algum tipo de problema com a Justiça e mesmo assim continuam convivendo no ambiente do futebol, direta ou indiretamente, e repassando seus reinados a afilhados. Não será surpresa alguma se eles forem flagrados no Brasil. Resta saber fazendo o quê.

BRIGAS EM MUNDIAIS

MÉXICO 1986

Ao todo, eram 120 argentinos, que levaram como uma questão de honra brigar com os hooligans antes da histórica partida contra a Inglaterra, quando Maradona fez um gol de mão. Gustavo Grabia relata que "os hooligans vinham precedidos por uma lenda de terror na Europa. Além dos barras, haviam se somado para a ocasião um grupo de exilados e 50 escoceses. A batalha aconteceu na capital. Dias depois, para a TV de todo o mundo, a barra argentina mostraria as bandeiras britânicas como sinal de vitória. No festejo da vitória da Copa, ao regressar, La Doce encabeçou a caravana que levou a equipe até a Plaza de Mayo. A conjunção entre ambos, barras e Seleção, terminou de ser selada oficialmente dois meses depois."


ITÁLIA 1990

Com o futebol argentino em alta – a seleção chegaria à final novamente, mas perderia para a Alemanha –, torcedores do Independiente brigaram com os do Boca Juniors, que receberam ajuda da barra do Estudiantes. Outros torcedores do Chacarita, River Plate, Racing, Estudiantes, Rosário Central, Gimnasia de La Plata, Vélez, Banfield, San Martín de Tucumán, Newell's e San Lorenzo se envolveram na confusão. Era a época áurea da barra do Boca Juniors.

FRANÇA 1998

A organizada do Boca Juniors pretendia voltar à hegemonia da violência no futebol argentino, mas o técnico da seleção era Daniel Passarella, e a barra do River Plate – Los Borrachos del Tablón – tinha a preferência. A La Doce precisava levar um número expressivo de fanáticos para fazer frente. De acordo com Gustavo Grabia, "houve um aporte financeiro significativo de torcedores famosos, de gente do clube e também de políticos. E, como sempre, a barra recorreu aos jogadores. A maioria dos barras argentinos revendeu por US$ 500 seu ingresso para turistas. Alguns da segunda linha da La Doce quiseram se passar de vivos e revender o ingresso mas, ao mesmo tempo e com violência, recuperá-lo. Má ideia em uma província francesa cujos negócios ilegais eram dominados pela imigração africana. Tiveram uma briga séria com os africanos."

ALEMANHA 2006

Desde 1990 que La Doce não tinha uma presença marcante em mundiais. Gustavo Grabia ressalta que "longe das fartas noites do México, Itália e França, os barras do Boca tiveram de se conformar em se estabelecer na República Checa, onde tudo custava 50% menos do que na Alemanha, e viajar apenas para os jogos. Claro que essa mesma ideia tiveram os barras do Independiente, que também foram ao Mundial. Depois da segunda partida, eles cruzaram a fronteira para reduzir gastos. E como Deus os cria e eles se juntam, se encontraram em plena zona quente. Olhada vai, insulto vem, se pegaram em frente à porta do hotel. Foram cinco minutos de batalha crioula em plena República Checa, até que chegou a polícia. Depois de uma detenção de 48 horas, foram todos expulsos do país."

AFRICA DO SUL 2010

Gustavo Grabia escreve que "em maio, o avião que transportava a seleção levava 23 barras. Foi um escândalo com muitos apoios: eles iam com bumbos financiados pelo sindicato Utedyc, ingressos que vinham do seio da AFA, bandeiras despachadas com o carregamento oficial da Seleção e financiamento de Enrique Antequera, homem forte do Justicialismo. O que se pagou em cash foi US$ 65 mil. Uma fortuna. O escândalo do barratour tomou uma dimensão tal que as autoridades africanas deportaram 48, entre eles 18 do Boca. Os 25 restantes continuaram indo ao Mundial, mas a trégua com as barras de outros clubes terminou quando a Argentina foi eliminada pela Alemanha. Uma hora depois da partida, na Cidade do Cabo, um grupo do Independiente emboscou a outro do Boca para roubar-lhes uma bandeira e a briga terminou com a morte de Luis Forlenza."



quinta-feira, 5 de junho de 2014

BARRABRAVAS AMEAÇA DO PRATA



ZERO HORA 05 de junho de 2014 | N° 17819

MAURICIO TONETTO

BARRABRAVAS. CONHECIDO PELA VIOLÊNCIA gerada durante enfrentamentos com rivais em eventos esportivos, grupo de torcedores argentinos será monitorado no Estado, inclusive na Fronteira, onde a PF tem nome dos mais perigosos


Em cinco das últimas sete Copas do Mundo, eles arrumaram confusão e espalharam medo. Brigaram entre si, com torcedores de outros países, foram deportados e mataram um homem na África do Sul. Voltaram para casa com máscaras e dedos em riste. Organizados nos moldes da máfia, eles subornam policiais, pressionam dirigentes, vendem drogas nas arquibancadas e imediações dos estádios, administram estacionamentos, repassam ingressos, cobram comissões por passes de jogadores e militam em partidos.

Os barrabravas argentinos, conhecidos mundialmente pelos trapos e cantorias intermináveis nas canchas da América Latina, especializaram-se em atos ilícitos e estão entranhados no futebol e na política da Argentina bem além do espetáculo.

Mais de 500 são esperados no Brasil, sem contar os apoiadores de Boca Juniors e River Plate, as grandes equipes portenhas. Desde 2009, a maioria se uniu para torcer no Mundial por meio da ONG Hinchadas Unidas Argentinas (UNA), entidade apoiada e financiada pelo governo kirchnerista em 2010, na África do Sul. Neste ano, a torcida do Independiente – que protagonizou alguns dos espetáculos mais violentos do futebol nas últimas décadas – vai estar à frente da agremiação, que conta com apoiadores de diversas torcidas menores, da segunda e terceira divisões. Conforme Diego Llumá, diretor de Cooperação Internacional do Ministério da Segurança do país, é impossível prever o que acontecerá no Brasil:

– Não existe nada fora de contexto. Os riscos de violência, agora, estão vinculados às disputas internas nas barras e aos negócios. É uma máfia que tem a cumplicidade da polícia e dos dirigentes dos clubes argentinos. Caberá ao Brasil, por meio dos mecanismos de vigilância e controle, coibir a atuação deles.

O histórico dos barrabravas preocupa as forças de segurança brasileiras. Uma lista com mais de 2 mil nomes foi repassada há duas semanas pela polícia argentina à Polícia Federal, que mantém o documento em caráter confidencial. Em Porto Alegre, eles estarão no dia 25 para o jogo contra a Nigéria.

O secretário extraodinário de Segurança para Grandes Eventos, Andrei Rodrigues, admitiu preocupação com os barrabravas:

– Preocupa por ser a torcida mais volumosa. Recebemos do governo argentino, em Porto Alegre, uma lista de torcedores impedidos de ingressar em eventos esportivos. Ela foi repassada à Polícia Federal.

Rodrigues ventilou a possibilidade de torcedores serem barrados na Fronteira.

– Eu não posso te afirmar. Mas possibilidade concreta, há. E não se limita à lista.

HISTÓRICO DE CONFRONTOS E MORTES LIGADAS AO FUTEBOL

Um dos que mais preocupam é Pablo “Bebote” Alvarez, comandante do Diablos Rojos (Independiente) e da UNA. Ele esteve na África do Sul em 2010 e acabou expulso. Em guerra contra o então mandatário do clube, Javier Cantero – que renunciou ao cargo –, Bebote, mesmo proibido de frequentar estádios, diz que concorrerá à presidência.

– A impunidade é um problema que atinge toda a Argentina hoje e extrapola os estádios – analisa Ignacio Uzquiza, do Ministério da Segurança.

Martín Araujo, do River Plate, foi detido no Monumental de Nuñez com armas brancas e 200 carnês de sócios. Proibido de frequentar jogos, o militante do Partido Justicialista, o mesmo de Cristina Kirchner, é suspeito de ser protegido da presidente e de ter armado um esquema de caixa 2 com a conivência de dirigentes e do ex-treinador Daniel Passarella.

Nas últimas décadas, os barrabravas foram responsáveis por grande parte das agressões em partidas de futebol na Argentina. Desde os anos 1920, conforme a ONG Salvemos al Fútbol (SAF), já causaram mais de 270 mortes. As regalias vividas por seus líderes são dignas de personagens da máfia. A cúpula da Guardia Imperial, do Racing Clube, por exemplo, fez um cruzeiro pelo Brasil no ano passado ao custo de US$ 1,6 mil, por pessoa. De acordo com o jornal argentino La Nación, eles movimentam cerca de 200 mil pesos (R$ 56 mil) mensais em revenda de ingressos e merchandising de artigos oficiais.


ENTREVISTA


Entrevista com Gustavo Grabia, jornalista


“Sempre há algum problema em Copas”

Editor do diário esportivo argentino Olé, Gustavo Grabia, 46 anos, é hoje o maior especialista em barrabravas no mundo. Ele levou quatro anos para reunir as informações do livro La Doce, sobre a violenta torcida do Boca Juniors, e investiga os crimes cometidos pelas organizadas no país. Em entrevista a ZH, Grabia disse temer atos violentos durante a Copa do Mundo. Confira os principais trechos:

Torcidas rivais, que pregam o ódio mútuo, se unem durante a Copa. Como isso é possível?

Há cinco anos, eles resolveram se agrupar na Hinchadas Unidas Argentinas (HUA) para poder viajar ao Mundial da África do Sul. Para isso, trabalharam junto ao governo de Cristina Kirchner e, em contrapartida, foram financiados. Agora, decidiram seguir com esse esquema. Perceberam que quanto mais se organizam, mais pressão exercem nos políticos, clubes e sindicatos. O país está rivalizado politicamente, e eles aproveitam esse momento da Copa do Mundo, em que há uma trégua em nome da seleção, para atuar.

Essa união deles será uma garantia de paz durante os jogos no Brasil?

A união se faz para poder conseguir os ingressos, as passagens aéreas e os financiamentos. Uma vez atingido os objetivos, está feito. Sempre há algum problema em Copas, não posso assegurar que não vai acontecer nada no Brasil. Historicamente sempre acontece confusão. Creio que eles até viajam com a ideia de que não ocorra nada, mas o desenrolar diz outra coisa.

Existe uma torcida oficial em cada Copa, relacionada ao treinador da seleção?

Não. Da mesma forma que aconteceu no último Mundial, a hinchada que terá a maior quantidade de adeptos é a do Independiente. São eles que lideram atualmente a HUA, mas isso vai mudando.

O senhor considera as barra bravas organizações mafiosas?

Não tenho nenhuma dúvida de que são mafiosas pelos métodos de pressão e ameaça que utilizam. Eles chegaram ao entendimento de que individualmente são pequenos, mas unidos, uma grande torcida. Isso lhes dá mais poder de negociação com as autoridades e mais benefícios. Hoje, as barras trabalham para um monte de políticos, cada uma atua para o partido político de sua zona, já não estão mais vinculadas apenas ao governo federal. Os partidos políticos se aproveitam delas como uma força policial. Eu não tenho esperança de que a situação melhore. A tendência é só piorar. Oxalá que eu esteja equivocado.